domingo, 7 de setembro de 2014

Mansur Som - A rádio de poste do Belo Centro

Mansur Som
A rádio de poste do Belo Centro

Escolhi, para fazer esse trabalho, a rádio de poste do centro comercial de Belém, cuja história se confunde com a história de vida da minha família, e, portanto, com a minha própria.

Desde o final da década de 40, meu avô materno, o Sr. Antônio Mansur, brasileiro com ascendência árabe nascido em Maués, Amazonas, instalou e comercializou anúncios comerciais na praça da igreja matriz na Vila do Mosqueiro.

O sistema era muito simples: bocas de ferro instaladas no alto dos postes da praça e muita disposição pra bater perna e vender seu produto entre os comerciantes locais: anúncios comerciais. Entre uma e outra veiculação, notícias sobre o tempo, a sociedade local, os horários de chegada e saída do vapor (que levava e trazia veranistas de Belém), entre outras amenidades.

Mas o antológico ‘Seu Mansur’, que tinha lá seus desafetos, comprou uma briga com o prefeito de Mosqueiro (hoje seria agente distrital) e acabou levando um tiro na perna (nada demais, apenas de raspão), o que o fez retornar a Belém, já no ano de 1960.

Como isso era a única coisa que sabia fazer, ele procurou a prefeitura local e propôs fazer a mesma coisa – uma rádio de poste – no centro comercial da capital. O prefeito da época era Moura Carvalho, grande entusiasta do rádio, que permitiu que um dos pioneiros (talvez ‘o’ pioneiro) das rádios de poste no Pará fizesse o que sabia fazer de melhor: comunicar.

A partir daí o sistema de rádio de poste começou a funcionar pela feira do Ver o peso, depois passou pra Praça do relógio e por último foi instalada a primeira rádio de poste do centro comercial de Belém, que se estendia desde a Presidente Vargas até a Av. Portugal, pelas ruas João Alfredo e Santo Antônio, além de algumas transversais como Padre Eutíquio, Campos Sales e Padre Prudêncio. Esse perímetro que eu especifiquei acima cobre todas as principais ruas do comércio de Belém, ou seja, a rádio de poste tinha um enorme alcance entre os transeuntes que freqüentavam o chamado Belo Centro.

O serviço consistia em visitar uma a uma as casas comerciais da época, tais como: Radiolux, Avistão (conhecida loja do posterior governador do Pará), Nossa Livraria de Belém, Ótica disco de ouro, Sapataria Carrapatoso, Sapataria Leão de Ouro, Farmácia Droganossa, Joalheria Sulamericana, Livraria Jinkings, Papelaria e Livraria Vitória, Lojas Center, Loja de ferragens Portuense, entre muitas, muitas outras; e oferecer o único produto da rádio de poste: anúncios comerciais.

A coisa era feita da seguinte forma: não havia spot gravado, a mensagem era lida, ao vivo, pelo locutor. Se o cliente pagasse por 20 inserções diárias, seriam 20 as vezes que o locutor leria o anúncio ao vivo. Mas graças ao avanço da tecnologia logo depois veio o rolo magnético, o que permitiu que os anúncios fossem gravados. A Aiwa, marca japonesa muito respeitada, era pioneira da fabricação desses aparelhos (que eu via com muita freqüência nos estúdios da casa dos meus avós e do comércio).

rolo aiwa.jpg

Durante muitos anos a MANSUR SOM foi responsável pela veiculação dos anúncios comercias das lojas do centro comercial da capital. Isso numa época anterior aos camelôs, às aparelhagens de rua, às lojas que colocam uma caixa de som (como a mostrada abaixo) na frente das lojas com um vendedor gritando na frente (e afastando os clientes com gracinhas grosseiras).

caixa de som.jpg

Era uma Belém mais elegante, mais classuda, que não recebia bem gritos e essa competição por quem aumenta mais a sua caixa de som. Competição essa em que o cidadão sempre perde, lamentavelmente.

Além das inserções comerciais – que informavam, por exemplo, que chegaram sapatos novos nas Lojas Carrapatoso ou que a Livraria Jinkings já está com a sua lista completa de livros didáticos – haviam também vinhetas com a hora certa, notícias em forma de notas rápidas, vez por outra um programa do gestor com uma breve prestação de contas, entre outras inserções que variavam de tempos em tempos.

A rádio também prestava serviços a população, como por exemplo, anunciava quando alguém perdia ou achava documentos no centro comercial.


Meu avô faleceu há 4 anos, completos no dia 23 de Junho. Faleceu com 86 anos, numa quarta-feira. Na véspera tinha ido trabalhar normalmente, vendendo seus anúncios comerciais e recebendo por eles, nas casas comerciais de Belém. A rádio ainda existe, hoje conta com mais de 54 anos de funcionamento, e é gerenciada pelo meu tio mais novo, Fábio Mansur, herdeiro do conhecimento e bom nome do Seu Mansur.

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